Nos embalos gritantes da esferográfica
Faço raivosos rabiscos na cópia xerográfica
Ensaio na mente as palavras urgidas
Anseio revelar os estágios da minha história.
Perto dos 82 anos de idade a vaga gloria,
Mas, as memórias são incoerentes e fingidas.
As horas passam nada eu escrevo
Ouço baixinho o ponteiro e não vejo
O relógio noticiar as marés do entardecer.
Repouso a cabeça no ombro fadigado,
Alcanço o sol andar no piso desgastado
Em turbilhão a lembrança a emudecer.
Assisto a fração jazida do sapo cururu
A deleitar a refeição quebrando o jejum
Que não é concluído e se bulindo regurgita
O pedaço de isopor que achou ser pão
Ao lado, o meu filho, segura com a mão
E come o antes rejeitado e não vomita.
A terra dura faz gritar a enxada
Escassez é a nossa faixada…
Revivo a era do passado presente.
Neste dia, ouço distante a doação
De serviço a proclamar a construção
Da capital, do teto, eu sou ausente.
Por mais de dois anos fui o dito capitão
Carregando os muitos pesos do chão
Servindo os homens de habilidade
Da terra, pedra e cimento fazem arte.
No fim do dia, o então amigo Duarte
Apresenta a sentença da liberdade.
Os cúmplices se dão nos últimos abraços
Neste clima de despedidas e embaraços
Trocamos brindes de irrisórios valores
Estes pra gente são em muito especial
O amigo Duarte em palavra espiritual
Deixou o recado para mim só olhar
O que me dera quando chegar
Na terra natal, com um abraço
Foi-se a despedida com sucesso
Fazendo esquecer o regresso
Que levo comigo no vivo disfarço.
Desse lapso, volto com pancadas
Do corredor, que são abafadas
Pelo silêncio da minha solidão.
É o filho, que aqui veio me visitar
Como um bom pai começo a disfarçar
O sofrimento em imutável explosão.
Nas palavras miúdas faz dizer
Que o tempo esculpiu o viver
A cada segundo da despedida…
Assim, deu vida a dor da saudade
Revestida em acomodada liberdade
Dá um presente a minha medida.
Levanto o corpo pesado e arenoso
Caio sem força. Ali, o baú luminoso.
Incomodado, ele trás e entrega a mim…
Isso perpassa o sensacional
Careço ir ao Congresso Nacional
Para a entregar antes do meu fim.
O meu filho, olha pra mim e fala:
“Pai, vamos fazer a sua mala”.
Há mais de 40 anos foi negada
A viagem dos construtores
De Brasília, só para os doutores,
Da nossa mente a ideia apagada.
Agora no tempo vivo e verdadeiro
Piso onde trabalhei com o pedreiro…
“Hei senhor”, escuto alguém gritar,
“Não pode pisar aí, o que quer?”
Essas paredes eu ajudei pôr de pé.
A casa do povo venho visitar.
Do bolso da jaqueta tiro a mão…
Vim aqui devolver, meu irmão!
“É uma bomba, um atentado”.
Dois deles me empurra com força,
Jogado no chão. Por favor!! me ouça,
Não sou bandido, sou um aposentado.
É uma pedra, moço, pra devolver
Quero só o meu, tenho o que viver
Foi engano do amigo Duarte…
Por anos e anos tentei vim pra cá
Essa pedra, jamais eu posso pegar
Seu moço, não quero nenhum desastre.
Livrei-me do peso com a disperdida
Da pedra que antes fora bem vendida
Por 42 anos sentir o peso da dor
De usurpar do povo guerreiro
Na própria casa é um forasteiro
Se meu não é, entrego até o sem valor.<<Escritor Samuel Tenório (18/09/2019)>>>
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